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Cultura fitness do Instagram pode ser algo saudável? 02/02/2018

Se você é usuário do Instagram e já acessou a aba “pesquisar” do aplicativo, provavelmente já se deparou com uma dezena de exemplos deles: os influenciadores digitais do mundo fitness. Pessoas que passam uma boa parte do tempo postando fotos e vídeos para exibir corpos sarados, recomendar produtos saudáveis ou dar dicas de moda e comportamento.

A força desses verdadeiros profissionais das redes sociais não é pouca. Segundo um estudo da Youpix e da Airstrip, – empresa especializada em mineração de dados de mídias digitais – em 2016 já eram 230 mil no Brasil. Eles são apenas 2% dos usuários no país, mas são responsáveis por 54% das interações que ocorrem nas redes sociais (Youtube, Facebook, Instagram e Twitter). Só no Instagram, por exemplo, a mais popular – segundo o estudo – das 5,2 milhões de postagens analisadas, 18% se referiam a viagens e 15% sobre saúde. (...)

Para a neuropiscóloga Keli Rodrigues, sócia da clínica Sutil Psicologia, em Brasília, a influência das redes sociais, no entanto, requer cuidados. Isso porque as pessoas tendem a buscar modelos de comportamento para embasar perspectivas de mundo sobre si mesmas. Ela afirma que problemas como ansiedade ou depressão podem ocorrer ou se agravar em quem busca padrões tão altos que sejam impossíveis de serem alcançados. “Não se deve adotar como parâmetro uma realidade que não condiz com sua capacidade de execução, pois devemos lembrar que os modelos das redes sociais, muitas vezes, vivem apenas em função de manter a boa aparência”, explica.

Para a especialista, as pessoas que buscam esse objetivo devem empenhar esforços em mudanças de hábitos contínuos e acompanhados por profissionais especializados. “Eles serão capacitados para orientar no que é possível e adequado para as condições atuais da pessoa, considerando fatores de risco e um corpo que não seja talvez perfeito, mas sim saudável e satisfatório para o indivíduo”, completa.

A dificuldade é que a popularidade dos perfis fitness em redes sociais torna mais delicada a busca pelo profissional certo. O Conselho Federal de Nutrição (CFN) tem feito uma campanha de conscientização sobre influenciadores digitais que prescrevem dietas para seguidores nas redes sociais. Para a conselheira Regina Rodrigues Oliveira, essa prática coloca em risco a saúde das pessoas. “O que pode dar certo para um pode ser extremamente prejudicial para outros. Dieta tem que ser individualizada, elaborada considerando a idade, o estilo de vida, os dados antropométricos e bioquímicos do indivíduo, bem como as suas condições econômicas, sociais e culturais”, explica a conselheira.

O CFN alerta ainda que o nutricionista é o único profissional habilitado para prescrever dietas e realizar assistência e educação nutricional. A prática dessas atividades, seja presencial ou no meio digital por profissional não habilitado - e sem seguir os parâmetros do código de ética da profissão -, é considerada exercício ilegal da profissão. “Nutricionistas têm alertado a população sobre os riscos dessas dietas, que se apresentam quase sempre como ‘milagrosas’. Salientamos que essas pessoas não estão comprometidas com a saúde da população, mas sim em ampliar o número de seguidores”, alerta.

Um dos casos mais emblemáticos de denúncias contra personalidades das redes sociais foi o da influenciadora Gabriela Pugliesi. Considerada um fenômeno do Instagram, ela deixou o emprego formal em uma joalheria para empreender no meio digital. Apesar dos frutos colhidos (são mais de 3,7 milhões de seguidores e o canal no Youtube já passa dos 560 mil inscritos), Pugliesi, que não tem formação técnica, já foi denunciada por exercício ilegal da profissão, tanto na prescrição de exercícios quanto de dietas.

Na ação que resultou da denúncia do Conselho Regional de Educação Física do Rio de Janeiro (CREF-1), Pugliesi concordou em pagar um valor de quatro salários mínimos e retirar do ar programas do Youtube em que havia relação de atividades físicas com exercícios, segundo consta em processo julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Já em ação movida pelo Conselho Regional de Nutricionistas da 3ª Região (CRN-3), a influenciadora foi absolvida. Procurada pela reportagem, a assessoria informou que Pugliesi não se pronuncia mais sobre os casos.

Mas nem tudo precisa ser guerra. O presidente do Conselho Federal de Educação Física (CONFEF), Jorge Steinhilber [CREF 000002-G/RJ], reconhece que as redes sociais podem ser uma grande ajuda para estimular a adoção de práticas mais saudáveis, desde que essas informações sejam usadas de forma correta e consciente. “Vale lembrar que as pessoas não devem sair por aí tentando copiar o que assistem. Elas devem procurar um Profissional de Educação Física que fará uma avaliação sobre o condicionamento atual e desenvolverá uma estratégia de treino alinhada aos objetivos da pessoa”, destaca.

Ele acredita que agregar as novas tecnologias faz parte de qualquer profissão e que é natural que muitas pessoas, por questão de economia ou conveniência, busquem pela chamada mentoria online. Mas para Steinhilber, é preciso ficar atento ao profissional, para evitar os famosos charlatões, e manter avaliações periódicas. “Só assim as pessoas vão adotar os hábitos saudáveis como algo contínuo. Se elas apenas copiam os influenciadores, se frustram e logo abandonam a prática da atividade física”, conta. Outro perigo apontado pelo presidente é para a saúde. “Muitas vezes, uma lesão decorrente de um exercício físico inapropriado pode surgir dez, quinze anos depois. E a pessoa nem se lembra”, alerta.



Fonte: O Quebra Cabeça